O mundo vive neste momento, uma crise chamada Covid-19 ou coronavírus, você preferir chamar. Uma pandemia que afeta diversos países e já registra mais de 283.153 mil mortes oficialmente confirmadas pelo OMS.
No Brasil, já são mais de 11 mil vidas perdidas. Entretanto, não se pode esquecer que estes números são apenas dos casos registrados. Infelizmente muitas pessoas que foram contaminadas sequer conseguem ter o diagnóstico pela insuficiência de testes laboratoriais.
Além das vidas perdidas, ainda temos que enfrentar os reflexos da pandemia. Atendimento hospitalar caótico, empresas fechadas, trabalhadores desempregados, autônomos sem renda, entre outros problemas que vêm afetando a vida de todos os brasileiros.
Na tentativa de frear esta crise, o chefe do poder executivo, Jair Messias Bolsonaro, vem adotando diversas medidas, entre elas a flexibilização das relações trabalhistas durante o período de calamidade reconhecido pelo Decreto Lei Nº 6, DE 2020, que vai até 31 de dezembro de 2020.
As principais medidas adotadas pelo Governo estão normatizadas na Medida Provisória 927 e também 936. A primeira traz algumas alternativas para evitar das demissões, como trabalho home office, antecipação das férias, banco de horas, entre outras opções.
A segunda estabelece regras para a redução salarial mediante jornada de trabalho, ou mesmo a suspensão do contrato de trabalho, e é sobre os impactos da aplicação inadequada dessas medidas que quero tratar aqui.
Se você não é do Direito, precisa saber que as normas, de um modo geral conversam entre si, ou pelo menos, é esse um dos objetivos do Direito, manter as normas em harmonia. Quero dizer que uma lei, por exemplo, não pode ser aplicada de forma isolada.
No caso do Direito do trabalho, temos a CLT e diversas normas específicas, como é o caso, por exemplo, da Lei Complementar 150 que trata do trabalho doméstico, e acima de todas temos a Constituição Federal, em que todas as outras normas devem estar em harmonia com ela.
Como mencionei anteriormente, as MP’s 927, 936 e outras mais, foram editadas com objetivo de flexibilizar as relações trabalhista neste momento de crise, no entanto, muitas empresas estão aplicando as MP’s de forma errada, mal planejada e em alguns casos, de má-fé, o que leva a acreditar que após esse momento tão difícil que o país está vivendo muitas ações trabalhistas poderão surgir, e isso será mais um problema que elas deverão enfrentar.
Sobre a aplicação das medidas provisórias, é preciso que fique claro, que a CLT não foi revogada, tão pouco a Constituição Federal. O Brasil é membro da Organização Internacional do Trabalho e também é signatário da declaração universal dos direitos humanos, ou seja, as empresas não podem aplicar as medidas disponibilizadas pelo Governo de forma descuidada e irresponsável para com seus colaboradores.
Que fique claro, que o objetivo aqui é defender o equilíbrio. As empresas precisam dos trabalhadores, assim como os trabalhadores precisam das empresas.
No entanto, é fato que numa relação trabalhista, em regra, o trabalhador é a parte hipossuficiente, ou seja, é o mais frágil da relação, ainda mais no Brasil com tantos trabalhadores analfabetos ou analfabetos funcionais, por isso, é importante que o empregador zele por seus empregados. Assim, todos saem ganhando.
Se você quer saber que caminho seguir para evitar problemas futuras, sigas migalhas de pão:
Bom senso;
empatia;
respeito às leis;
tratar o desigual na medida de sua desigualdade;
planejamento e organização.
Acordo com o trabalhador
Algumas medidas criadas pelo governo exigem de forma expressa a realização de acordo entre as partes, seja de forma individual ou coletiva. A redução do salário mediante redução de jornada e a suspensão do contrato, são dois exemplos.
No entanto, existem situações em que a empresa poderá adotar medidas de forma unilateral, é o caso, por exemplo, da adoção do teletrabalho e antecipação das férias.
De todo mundo, ainda que as MP’s permitem em alguns casos, a tomada de decisão de forma unilateral por parte do empregador, o ideal é buscar sempre o acordo. E se tiver a participação do sindicato da categoria, melhor ainda.
Se você quer ser mais segura jurídica e evitar problemas futuros, opte sempre pelo acordo. Não esqueça que a Lei 13.467 de 2017 em seu artigo 611-A deu força aos acordos e convenções coletivas, ao afirmar que estes instrumentos de negociação têm prevalência sobre a lei em algumas situações, por exemplo, na adoção do teletrabalho e banco de horas, por isso, se possível opte pelo acordo sempre.
Em relação à antecipação das férias o empregador tem a liberdade de decidir sozinha em que momento o trabalhador poderá tirar férias, conforme o artigo 134 da CLT.
No entanto, o fracionamento deve ser acordado entre as partes, ou seja, o empregador não tem a faculdade de impor o fracionamento das férias empregado como determina o artigo 134, parágrafo 1° da CLT.
Além disso, é interessante evitar antecipar férias futuros, pois o trabalhador corre o risco de passar mais de 2 anos sem gozar férias, o que não é permitido pela Consolidação das Leis do Trabalho. A não ser que ocorra de forma fracionada.
Licença Maternidade
Sobre a Licença-Maternidade muito se questiona se com a edição da MP 936 é possível reduzir o salário da trabalhadora, ou mesmo suspender o contrato da mesma.
É importante esclarecer inicialmente, que segundo a MP 936 em seu artigo 6°, parágrafo 2°, inciso II, alínea a, quem está em gozo de benefícios previdenciárias não tem direito ao BEM, com exceção de quem recebe pensão por morte ou auxílio acidente de trabalho.
Veja, que a empregada em gozo de licença maternidade está em gozo de benefício previdenciário. Apesar da empregada receber o benefício por parte do empregador, este não é de fato, quem paga o salário maternidade, pois o valor pago é deduzido na guia de recolhimento de previdência social da empresa.
Conclui-se que, não pode haver a redução salarial ou mesmo a suspensão do contrato da empregada em gozo de licença maternidade, até porque, a própria licença maternidade já representa uma suspensão do contrato.
Desligamento de empregados
Em relação aos desligamentos, mesmo durante a calamidade devido ao coronavírus, nenhuma empresa é obrigada por lei a manter empregados, logo, o empregador tem liberdade de desligar os empregados.
O importante é ter atenção aos empregados com garantia de emprego devido a estabilidade e em relação à utilização da rescisão por força maior, visto que isto pode ser questionado pelo empregado na justiça do trabalho, e a força maior poderá ser descaracterizada.
O argumento de muitos juristas, é que uma medida provisória não pode determinar a força maior de forma objetiva como está previsto no artigo 1° parágrafo único da MP 927, ou seja, é preciso analisar caso a caso.
Um coisa é certa, a aplicação da força maior será um tema muito discutido futuramente e muito polêmico, por isso, se a empresa tem a possibilidade de optar por outras alternativas, deixe a força maior de lado.
Redução salarial
A redução salarial e jornada de trabalho também merece atenção. As regras você pode encontrar em outras matérias aqui no nosso blog, a principal delas é o acordo então, quero apenas ressaltar o cuidado em manter o controle de jornada e não esqueça dos intervalos.
Se um trabalhador que trabalhava, por exemplo, 8 horas por dia e teve sua jornada reduzida para 6 horas, ele precisa do intervalo de no mínimo 15 minutos.
Como mencionei antes, a CLT, Constituição Federal, normas de segurança e saúde do trabalho estão em vigor, por isso, não cometa o erro que olhar apenas para as Medidas Provisórias, pois é um erro reduzir o Direito do Trabalho Brasileiro elas.
Para finalizar este tópico, apesar do tema não se esgotar facilmente. Não é aconselhado, ou melhor, não é correto eticamente falando, determinar as férias do empregado exatamente no período que em ocorra a redução salarial.
Não é preciso muitos argumentos para se verificar que o trabalhador ficará prejudicado. Lembre-se que as MP’s não mencionam de forma expressa sobre a possibilidade de aplicar medidas de forma acumulada e simultânea para o mesmo empregado, por isso tenha cuidado com aquelas que possam a vir prejudicar ainda mais o seu colaborador e futuramente, a própria empresa.
Suspensão do contrato
Em relação a suspensão do contrato, a orientação é a mesma, faça realmente o acordo, nada de impor isso ao trabalhador, pois isso pode prejudicar a empresa em momento futuro.
Vale mencionar aqui, que a MP 936 determina em seu artigo 8°, parágrafo 2°, inciso I, que o empregados fará jus a todos os benefícios concedidos pelo empregador aos seus empregados, mas não menciona que benefícios são esses.
O que posso lhe dizer é que no Direito do Trabalho existem os benefícios para o trabalho e pelo trabalho e não é difícil perceber a diferença entre eles.
Para o trabalho, o vale-transporte, por exemplo, mas se o contrato foi suspenso, não há que se falar em VT. A alimentação apesar de não obrigatório por e-mail, é normalmente obrigatório quando previsto em acordo ou convenção coletiva.
Benefícios como pagamento para educação, academias, plano de saúde entre outros, são concedidos pelo trabalho.
Bom, já que a MP não especifica nada sobre quais sejam os benefícios, na dúvida, o meu conselho é que a empresa mantenha todos os benefícios, em especial os previstos em instrumentos de negociação coletiva.
Eu poderia aqui destacar outros pontos, mas as situações que podem resultar problemas futuros são diversos, então vale reforçar o que mencionei no início da nossa matéria.
Bom senso, empatia, respeito às leis, planejamento e organização são fundamentais para que empresas e trabalhadores tenham uma boa relação, mesmo após um eventual fim do vínculo empregatício, especialmente neste momento tão difícil que estamos a viver.
Um abraço virtual!
Comentários
Postar um comentário